sexta-feira, 20 de novembro de 2015

A Playboy derrubou a Playboy. Nada mais.

Chegará ao fim em dezembro uma das publicações que marcou a imprensa brasileira: a Playboy. É preciso reconhecer que, antes de ser recheada de nus femininos, seu carro chefe, a revista trouxe diversas excelentes reportagens e ótimas entrevistas. Dentre as reportagens, destaca-se, dentre outras, o “encontro” de Carlos Zéfiro, famoso desenhista dos “catecismos”, gibis eróticos, que circularam na clandestinidade nos anos 60 e 70, de 1991. Entre as “conversas francas”, foram entrevistados de Lula a Jean Willys, de Fernando Henrique a Marco Feliciano, algo que, para os tempos atuais de extremismo à Direita que vêm marcando a Editora Abril, pode ser considerado algo democrático sempre ouvindo personagens controversos da Direita e da Esquerda. Assim como os ensaios, alguns clássicos como os de Christiane Torloni, Magda Cotrofe, Luciana Vendramini e outras musas, elas vão acabar em 2016 a menos que outra editora se interesse em seguir com a marca. A Abril já disse que não quer.
É preciso sair do círculo brasileiro para entender que a própria matriz estadunidense, que está revendo conceitos e informou que não publicará mais nus, também enfrenta as revezes dos tempos atuais. A revista foi criada em 1953 por Hugh Hefner e tinha como ideia original mostrar aquilo que jovens adultos queriam ver: carros, bens de consumo, comportamento e matérias de seu interesse. Hefner acreditava que, mais que mulheres, o jornalismo faria fidelidade entre o produto e os leitores. E estava certo. A marca se valorizou, a revista se internacionalizou e em 1975, a Playboy chega ao Brasil com o nome de Homem, pois a censura da ditadura militar vetara o nome original, mas ele será adotado em 1978. Como a revista, que prezou pelo jornalismo antes das mulheres pode ter selado seu fim, então?
Simples. A ideia de fazer uma revista para homens inspirou diversas editoras a lançarem concorrentes ou revistas genéricas sem, necessariamente, apelar, para o nu. Várias surgiram e sumiram, pois a Abril tinha bala na agulha para um cachê gordo e fotografar uma Luiz Brunet no seu auge, por exemplo. Mas a própria Abril dá munição para uma outra publicação sua, a VIP, com mulheres seminuas e em poses sensuais que, com bom jornalismo acaba suplantando, nesse campo, a coirmã. Restaria à Playboy centrar fogo naquilo que ea sempre soube fazer de melhor: os ensaios nus, afinal, a revista que teve como capa mulheres do calibre de uma Claudia Raia, uma Luma de Oliveira e uma Monique Evans no seu esplendor, não poderia perder a mão nesse campo. Perdeu.
No ano 2000, quando começou a febre do Big Brother Brasil, a Playboy conseguiu prioridade em fotografar as sisters que mais se destacassem no programa no aspecto beleza. E lançou mão dessa prioridade durante todas as edições. Não se nega que apareceram mulheres maravilhosas durante essas safras, inclusive surpresas. Em 2011, quando o programa revelou a transexual Ariadna, a revista disse que “não era de interesse do seu público ver a moça em suas páginas”. Realizada uma pesquisa pela Internet sobre qual sister deveria ser a estrela da revista, a vitória de Ariadna foi acachapante e a Playboy dedicou à moça uma edição especial. Foi a segunda transexual a figurar na revista. A outra tinha sido Roberta Close, com muito sucesso à época. O problema foi que, por lindas que fossem, essas mulheres (bem como outras, atrizes, apresentadoras, funkeiras) eram bonitas, tinham corpos perfeitos, mas não tinham algo que está difícil de encontrar: sex appeal. Também, as fotos de outrora, muitas dignas dos mais belos exemplares de exposições artísticas, perderam espaços para closes exagerados, alguns obscenos. Mulheres “normais” em poses grosseiras fizeram a revista perder público. Além do quê, as sucessivas crises que abalaram a editora Abril, que atravessa um momento complicadíssimo (Além da Playboy, outras duas revistas serão “descontinuadas” e jornalistas foram demitidos) e a facilidade de encontrar as mesmas fotos em qualquer site na Internet safando um curioso de gastar cerca de 15 reais para comprar uma revista também foram determinantes.
Tempos em que a vida “estilo playboy” e o jeito “macho” de ser são vistos com certa antipatia por feministas e homens que defendem a valorização das mulheres e não as veem como um pedaço de carne mais a tecnologia em todos os lados (inclusive em excessos de photoshop em algumas fotos. A Playboy virou piada em 2005 por “apagar” o umbigo de uma modelo numafoto em que houve retoque) selaram o fim da revista mais amada por adolescentes e fãs de boas reportagens. O Brasil não é o primeiro país onde a revista fecha as portas. Em alguns, ela voltou depois de um hiato. No fim, a própria Playboy, com erros internos (dispensa ou demissão de ótimos profissionais de fotografia e jornalismo, assuntos fúteis demais, má escolha em modelos), jogou na lama uma bela história construída, aqui no Brasil como na sua sede, muito além de peitos e bundas. Quem gosta de uma boa entrevista (mesmo com as perguntas clássicas “Com quem foi sua primeira vez?”, “Como foi?”, “Você já comeu alguma capa da PLAYBOY?”) e uma boa reportagem ficará órfão da revista mesmo sabendo que os bons tempos dela já estavam longe.

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Eu e meu pior leitor ou Dr. Jekyll & Mr. Hyde de caneta na mão

Ontem, depois de um longo tempo, escrevi uma poesia. Um soneto, como todos os meus, sem muita bola pra métrica, martelos e escolas. Preservo apenas a rima, que considero indispensável numa poesia. Com o perdão dos modernos e pós-modernos e respeito a eles, mas meu reduto clássico repousa nas rimas. Seja como for, depois de um bom tempo, escrevi um soneto, o que eu fazia quase em escala industrial. O tempo livre era demasiado e as preocupações eram poucas.
Conta é que eu escrevi esse soneto ontem. E hoje, meu pior leitor teve acesso a esse escrito. E para variar não gostou.
Tenho sérios problemas com esse meu pior leitor porque ele é, ninguém menos que eu mesmo. E isso, às vezes, me incomoda. Como posso, ao escrever, gostar do que acaba de sair (e confesso que ao fim do soneto, achei-o interessante) para poucas horas depois quase me arrepender de tê-lo escrito? Não é uma sensação nova. Sinto-a desde quando comecei a escrever, com uns dezoito anos.
Também o contrário, às vezes, acontece. Escrevo alguma coisa que, no último ponto, me desagrada. Penso “Poderia ser melhor”, mas deixo assim mesmo. Quando muito dou um retoque (e entendo a expressão “emenda pior que o soneto”). Passam-se dias, meu pior leitor vem, lê e fala na minha alma “Não acredito que você escreveu isso! Está muito bom!”. Meu pior leitor é meu maior crítico e um sujeito que, pelo visto, ama me sacanear. Só eu não entendo esse momento esquizofrênico de escrita e leitura tão dissonantes numa mesma pessoa.
Há muitos anos, conversando isso com minha ex-psicóloga, ela me aconselhou a ler algo sobre Dr. Jekyll e Mr. Hyde, que são a mesma pessoa. Quem não conhece, a história conta sobre o brilhante Dr. Jekyll que tem seu lado demoníaco ao qual chama de Mr. Hyde. Cheguei a essa conclusão. Escrevendo sou um Dr. Jekyll (que presunção!) e ao ler sou o Mr. Hyde. No filme, Jekyll garante que tem controle sobre seu lado mau, mas não é o que acontece. Hyde toma cada vez mais conta de Jekyll e se transforma quase em sua primeira natureza.
Bem é verdade que minha vida anda atribulada. Fim de ano, notas a fechar e entregar, aulas a ministrar, cansaço, expectativa, um caldeirão fervilhante que impede mais e melhores escritos. Porém, escrever, para mim, é, quando não uma terapia em que solto bichos e coisas que não saberia falar, uma diversão. Escrever, ao lado de ler, sempre foi um prazer do qual eu não me privava se tenho oportunidade. O problema é que, além de todos os contratempos, esse Mr. Hyde que se esconde em mim, às vezes, tem atacado meu Jekyll escritor a pauladas fatais. Inspiração para um poema, uma crônica até tenho. Só que antes deles virem à luz vem meu pior leitor e impede que o aconteça. Pegar esse censor íntimo dormindo permite respirar em letras como aconteceu ontem.
Acho interessante ter o lado crítico e sensato para impedir, ou mesmo parar, qualquer coisa que esteja sendo escrita e não seja boa. Mas me agradar tem sido complicado. Espero controlar esse Hyde maldito ou dar nele as mesmas pauladas que levo. Enquanto isso, a cada sono dele, um poema novo pode sair. Enquanto isso, o blogue vai sendo construído. Com essas postagens ele não implica.

domingo, 15 de novembro de 2015

Marianne, Mariana, mundo; mortes melhores, muitos menosprezados, malditos muçulmanos, mais, mesmo

(Foi meu recorde. Falta muito pra chegar em Mundo Moderno, que o Chico Anysio declamou maravilhosamente)

Dois dias após os atentados na França, as redes sociais viraram um campo de batalha entre duas tragédias. Paris ou Mariana? Houve quem colocasse a Nigéria de duas mil mortes em janeiro, o Quênia de atentado pouco falado na mídia brasileira e a Síria de todo dia no meio. Mortes a rodo, tragédias humanas que, se não têm o mesmo fim, tem o mesmo começo. Mas sejamos patriotas! Nossa tragédia vale mais. Mariana foi muito pior, seu colonizado!

Claro, claro! Hoje em dia, estamos tão corridos por tanta coisa que tão pouco vale que se é pra chorar por uma tragédia, que choremos por uma apenas. É preciso escolher uma pra chorar, uma pra lamentar. Lamentar por duas já é demais. Todas, então, é impensável. Ou uma ou outra. Tenho mais o que fazer no meu Facebook a ficar chorando tanta gente. Mas se a moda pede e a rede social facilita, vamos colocar aí a bandeira da França no avatar e estamos conversados.

Não sou uma pessoa fria e insensível. Sou francófilo por educação própria. Disse aqui que admiro os franceses, mas tenho raízes mineiras de onde vieram meus quatro avós. Acho que é o bastante pra doer meu coração peludo ver gente inocente morrendo na mão de uns malucos armados quanto uma cidade, um rio e parte da costa brasileira, no Espírito Santo, contaminada.

Tem isso também. Já fui pro Espírito Santo, de belas praias. Imaginá-las destruídas me dói mais ainda. E tem seres humanos como eu sendo mortos por vários e estúpidos motivos do outro lado do mundo. Meu coração pétreo está em pó.  Os de muitos não está, pois não sabem onde fica a França, onde fica Mariana e, imagina!, onde ficam os outros tantos países. Mas já que deu na TV, vamos lamentar.

Enquanto isso, pessoas que, em tese, pregam a palavra de deus cristão atribuem culpa a um contingente de dois bilhões de almas pela loucura de uns vinte em Paris e uns – sejamos otimistas – dois mil mundo afora. Afinal, muçulmano é terrorista, todos. Seus seguidores, ovelhas tangidas, balem o discurso. E aí ele aproveita a onda coloca a culpa na presidenta de um país. Qual a fé do extremista mesmo?

sábado, 14 de novembro de 2015

Marianne, Mariana e o mundo

Eu estava assistindo a um jogo de futebol entre França e Alemanha quando o primeiro estrondo aconteceu e outros dois se seguiram. Inocentes e sem imaginar do que podia se tratar (a cabeça da gente, pessoas de boa índole, ingenuamente nunca pensa o pior), os narradores apostavam em rojões. Foi bem depois que a verdade veio. Eram bombas e não eram as únicas e, muito menos, o pior. Paris estava fechada sob ataque. Tiros no centro da cidade. O Terror se achegou numa sexta-feira treze simbólica. O Jason não vestia máscara. Muitos desconfiaram que vestia turbante. Infelizmente estavam certos.
O Bataclan da vida real se transformava de lendária casa de shows num inferno em que a vida podia se abreviar numa decisão insana, que foi o fim de muitos. As facilidades da vida real mostraram quão tenso é estar num lugar desses quando um homem, de lá de dentro, com medo, narrou via Facebook o que se passava. Uma a uma, as pessoas eram mortas. Não sei que fim levou o rapaz. Seja qual for seu destino, se salvo, Marianne já estava bastante ferida. Marianne é a alegoria com a qual os franceses representam sua pátria. Algo como se os brasileiros escolhessem Iracema para ser a figura nacional. Lá, no entanto, é oficial a personificação de Marianne. E ela tinha sido alvejada. A romântica e poética Paris vivia momentos de campo de batalha desconhecidos desde a invasão alemã.
Da mesma forma que o mundo moderno nos transporta para o lado de um pobre homem que vê sua vida em risco, as redes sociais já se encheram de hashtags e o famigerado “Je suis”. Bandeiras francesas se espalharam pelo mundo virtual e orações por Paris se alastraram. Vilões, claro, foram culpados no mesmo momento. Imigrantes, que fugiram como puderam do mal que lhes perseguiu, viraram os inimigos. Todos foram para o mesmo balaio.

Claro que eu não acredito no poder de hashtags. Por elas, a corrupção no Brasil (e no mundo) tinha acabado, criminosos estariam condenados, crianças estariam salvas das mais diversas doenças e o Justin Bieber ou o One Direction teriam um milhão de esposas e namoradas. Nem tudo pode ser exatamente bom. Se não podem solucionar o mundo, podem ajudar. A hashtag #porteouverte era a senha para as pessoas que estavam no fogo saberiam que diversas casas nas imediações as receberiam. Também foi muito louvável que taxistas desligaram taxímetros para tirar dos locais de perigo as pessoas desesperadas e desprotegidas vez que metrôs tinham parado e a cidade estava convulsionada Pequenos sopros de solidariedade que fazem acreditar que existem pessoas boas (em diversas religiões) e não só malucos portando AKs.

Aliás, desde que comecei a estudar francês por conta da minha faculdade, permeada por franceses, passei a conhecer a história do país e a desmontar a ideia do francês arrogante, mal educado e porco. Gente assim existe democraticamente em qualquer lugar e fala qualquer língua. A França, desde sempre, foi grande incentivadora do livre-pensamento e da coexistência e convivência entre as diferenças. A célebre frase “Não concordo com uma palavra que dizes, mas defendo teu direito de dizê-las” é de um francês, Voltaire, embora muitos questionem isso. De qualquer forma é sabido que a França deu guarida a diversos perseguidos, bons e maus, e o dá até hoje. Gente com tamanha tolerância nunca é bem vista. Hitler via os franceses como inimigos potenciais e exemplo máximo de impureza. Marianne tem esse “defeito”.

Do outro lado do oceano, uma região está submersa debaixo de lama tóxica. A empresa responsável joga a batata para uma subsidiária e o governo estipula uma multa para a empresa pagar. Multa gorda, multa grosse. O que os conterrâneos falam? Nada! Quem chora pelo desastre ambiental e a perda de vidas e bens? Nada. Marianne cura suas feridas, mas pensa nas feridas de Mariana. Devia-se fazer o mesmo aqui. Infelizmente, para muitos brasileiros, la mort em français é mais bonita, a causa é mais nobre e o inimigo mais perigoso. Mariana que espere Marianne se recuperar. Talvez seja tarde demais, mas e daí? Hashtag tendo #uai não tem o charme de #jesuis qualquer coisa. Assim segue o mundo, que perde gente seja pelo fanatismo cego de diversos grupos como pela indignação seletiva de quem, de fora, pouco se importa.

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Porque hoje é sexta-feira 13 (meio a estilo do Humberto Gessinger)

(Hoje a coisa vai ser em pílulas)

Não me considero uma pessoa supersticiosa embora eu siga à risca um velho ditado espanhol “No creo em las brujas, pero que las hay, las hay”. Sou dos que acredita que existe, sim, uma ligação interplanos e que boas e más ações são sementes. Planta-se, elas frutificam e a colheita é obrigatória. Mesmo que você não queira, aparecem na porta da casa da sua vida.

Não é porque eu acredite em azar (palavra que, confesso, não gosto), mas tem certas coisas que não faço. Passar debaixo de escadas é uma delas. Nunca se sabe. Quanto a gatos pretos, não gosto que cruzem meu caminho. Não é superstição que ele me dê azar. Apenas prefiro cruzar o deles para que eles tenham sorte. Embora o simples fato de serem gatos já mostra um aspecto evolutivo adiantado. Gatos não creem nessas coisas. Eu que, em meu estágio humano um pouco atrás deles, creio nisso por eles. No fim é apenas uma competição involuntária ou uma diversão boba. Quem passar na frente de quem ganha. Se eu tropeçar nele ou pisar no seu rabo, eu perco. Por sorte, nunca aconteceu.

Opa, falei “por sorte”. Se eu tivesse poderes de alterar as regras ortográficas e abolir palavras na canetada, eu revogaria “sorte” da Língua Portuguesa e a substituiria pela sua tradução em francês: “chance”. Sua dicionarização em português é a melhor definição para ambas: Ocasião favorável, oportunidade. Sorte acontece a todo momento. O vivente é que não tem a chance (em português mesmo, mas pode ser sorte se preferir) de aproveitar. E aí bota a culpa em deus.

Deus, aliás, mandou dizer que não tem nada a ver com o riscado. Então, cave suas chances e crie sua sorte. O dia de hoje, como qualquer outro, vai oferecer várias. Mas também não dê mole pra cojaque. Quebrar espelho pode não dar sete anos de azar, mas pode dar sete pontos no pé se você pisar no caco sem ver. Tome cuidado.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Intromissão num fim triste

A crônica se dá por vários motivos, por vários casos os mais diversos elementos que, ao passar pelo olhar ora poético ora vadio do Cronista, incitam-no a colocar algumas letras formando palavras e destas arranjando e rearranjando frases. Daí nasce a crônica, às vezes fecundada pelo mais impensado motivo. Esse motivo, dependendo a qualidade do cronista, pode fazer fantástica uma crônica e ser o mais vulgar, mais reles de tudo. Se cai na mão de um bom cronista, um grão de arroz fica eternizado.
No entanto, o que me leva a essa crônica é algo alheio a mim diretamente. Hoje soube que um casal de amigos meus se desfez. Namoravam e não namoram mais. Casal convencional posto que hoje se aceita, pelo menos se tolera ou se devia tolerar, chamar duas pessoas de mesmo sexo de casal. O espaço não vale a digressão e a convicção do Cronista agora não precisa ser esmiuçada ou rebatida. Cabe apenas que é um casal convencional, homem e mulher. E que esse casal pôs um ponto final em sua história.
Evidentemente não darei os nomes dos personagens. Eles não precisam ser identificados na crônica até porque a vida íntima deles é deles apenas e casais se separam aos vários. Para as estatísticas que os jornais não mostram é apenas mais um casal dentre tantos. Uma separação que aconteceu e sobre a qual os pragmáticos diriam “bola pra frente” enquanto os românticos exortariam a volta de dois corações apaixonados. Resta ao leitor, que leu esse introito a pergunta: Se é mais um, por que a crônica? Porque são meus amigos, responderei. O leitor curioso e sedento por temas cotidianos e histórias pitorescas, num muxoxo, continuaria: E quantos amigos seus se separaram ou se separarão? Todos merecerão uma crônica? Responderei que não.
Sim, por serem meus amigos, merecem, estes específicos, uma crônica e a terão. O que acontece e os sublinha com a carinhosa dedicação de uma crônica é o fato deles se constituírem no tipo de casal que, mesmo dentro do que se convencionou chamar de “casal normal”, eram duas pessoas distintas no jeito de ser e agir. Eram pessoas que poucos apostariam ser um casal. Duas pessoas lindas e de ótimos corações. Agradabilíssimas, divertidíssimas e maravilhosíssimas que a insistência nos superlativos é o mínimo para descrevê-los. Pessoas tão boas de se estar junto que vê-los desafiava o conceito de “alma gêmea”. Gêmeos, supõe-se, são um par de iguais, de cópias quase idênticas e os dois eram de uma distinção tremenda. E se davam bem. Eram complemento e suplemento um do outro. Uma relação que tinha seus maus momentos, como tudo e todas e que infelizmente acabou.
O que levou a esse fim eu não sei e pouco me importa. Não me meto em problema de casa que não é minha e não levanto hipóteses. Também não sou o tipo de que incentiva uma volta. Se o fizerem, terão meu irrestrito apoio como o terão em qualquer decisão que tomem. Por ora, fica a tristeza de ver um laço tão bonito se desfazendo. E o leitor, se acompanhou até aqui essas breves linhas, agradeço. Diferente do grão de arroz que algum grande cronista eternize, esse namoro não foi eterno. Ou foi enquanto durou, como celebrou um poeta. A intromissão deste Cronista na bela história dos dois é um réquiem a algo bonito que aconteceu, mas amor tem mesmo dessas coisas.

Francisco Libânio,
11/11/15, 8:12 PM

terça-feira, 10 de novembro de 2015

A orwellização do mundo

Um dos livros mais chocantes que li foi o 1984 do George Orwell. Erro crasso meu de ler o livro após assistir ao filme (nunca façam isso!). O livro é bem mais terrível que a película e fez pensar nesse lance de Grande Irmão, da eterna observação que o vivente está submetido. E é tenso pensar que muita gente se sujeita de uma forma passiva a isso ou é seduzida sem perceber. Se é verdade que não temos um Partido que controle nossas vidas no plano sócio-político como houve em Oceânia nem a Novafala foi implantada (embora, certa forma, o empobrecimento linguístico trazido pelas redes dá fumos disso), a sensação de que estamos observados parece ser meio latente.
No livro de Orwell, cada cidadão é catalogado de alguma forma, tem uma espécie de identificação. Algo parecido, afinal todos temos nossos CPFs, nossos RGs, em nossos trabalhos temos uma inscrição e assim vai. Necessidades burocráticas que tornam (ou deviam tornar) a vida mais fácil. Quantos josés-da-silva existem nos lusófonos? Smiths, então, nos anglófonos, existem a rodo, muito além do Winston e muito além da banda do Morrisey. Nesse ponto, o número serve para distinguir.
Agora, a observação, a sensação incômoda de que um site na Califórnia conhece o que gosto de comprar, de assistir, o que penso politicamente, quais meus gostos musicais entre outras coisas é algo realmente pra assustar. Seja no computador enquanto digito este texto ou no celular enquanto navego, escuto música, sou açoitado por propagandas que, veja só!, vêm ao encontro dos meus agrados. Nunca sou incomodado por propaganda de cerveja, não sou convidado a ir ao mundo de cigarro algum, pois não fumo nem bebo. Mas, enquanto estou dando risadas de um site engraçado, aparece o merchan de uma livraria com títulos novos (boa parte deles não me chama ao coração. ufa, que sorte!) ou do novo disco que um artista de estilo similar ao que eu gosto (tipo, NX Zero, igualzinho ao Engenheiros do Hawaii, que eu adoro). Claro... Deixei essas informações em alguma rede social que participo. O artista, eu sigo em outra. A livraria eu visitei no site. Isso tudo engorda uma pasta que imagino, naquele relance esquizofrênico, com meu nome e informações sobre mim que nem eu mesmo conheço. Isso sem contar as deduções (i)lógicas que suponho eu façam. Por sorte, em muita coisa, caso do artista e estilo que eu disse, eles erram feio, erram rude.
O problema é quando para esses sites você simplesmente não existe ou, pior, você não é você, você é outro. Aconteceu comigo hoje quando fui entrar no Facebook (na verdade, voltar. Tinha entrado de manhãzinha e saído. Fui matar meu vício de conferir novidades) e sou informado que, segundo os funcionários e/ou estagiários do tio Mark, meu nome não é meu. Há pouco mais de um ano, uso no meu perfil meu apelido e não meu nome. Alguém deve ter achado Francisco Libânio um nome muito parecido, sei lá, com Brad Pitt e achou absurdo que um homem mais bonito que ele usasse esse nome por pura inveja. Denunciou minha conta ao Face que recomendou que eu o mudasse. Sem problema. Num mundo informático e informal, Chico é até mais seguro. Passei a ser o Chico Libânio que sempre fui no colegial. Pois muito bem. Hoje, o Face decidiu, sabe-se lá se por denúncia alheia ou implicância de alguém lá dentro (tenho muitos inimigos que trabalham no Facebook, eu acho, que devem ter uma inveja do meu sucesso), que Chico Libânio também não pode ser. Assim, quando entrei, pediram que ou mudasse meu nome (mandasse meu nome real, que não é aceito) ou provasse que eu sou eu. Instruído em como proceder, mandei foto de documentos (reais, sem nada de rede social, dois números que o “Partido” – o Estado – me deu, RG e título de eleitor). Agora aguardo os trâmites.
Longe de mim achar errado esse procedimento. As redes sociais, o Faceboook, coqueluche há anos, tem servido de esconderijo para os mais diversos insanos e irresponsáveis de opiniões criminosas e ideias próximas de terrorismo. Assim vemos gente defendendo extermínio de nordestino, morte a homossexuais, muçulmanos e negros como a domesticação de mulheres, esses seres que são biblicamente inferiores aos homens. Os argumentos para suas teses vão do absurdo ou mentiroso. E como se não bastasse a insensatez, ainda, usam fotos que não são suas, desenhos, símbolos e nomes que, evidentemente, não são seus. Escondidos, podem agredir, ofender e ameaçar. Não é meu caso, evidentemente, mas essas pessoas precisam ter uma forma de serem identificadas.
Sempre defendi que, ao entrar num fórum, num portal de notícias e, claro, uma rede social a pessoa obrigatoriamente devia deixar ali um cadastro real mesmo, e principalmente, se usar um pseudônimo. As pessoas precisam ser responsáveis pelas bobagens que dizem. É muito fácil dizer que tem que afogar nordestino e usar como nome Eric Cartman e o avatar do gordinho de South Park. Quem o processaria? É o que acontece com muitos no Face. Agridem, criam páginas de ódio pregando loucuras. Pode-se ser contra gays, comunistas e feministas. É uma condição da liberdade de expressão se opor ao que se convencionou chamar politicamente correto, paciência se se discorda disso. Mas entre ser contra e pregar a morte de homossexuais e o estupro de feministas além da prisão de não sei quais opiniões há uma distância perigosa e que deve ser combatida, pois sai da seara da opinião e entre no campo da apologia à violência. Não acho que estejam dissociados o discurso feroz de alguns parlamentares contra a imigração e a morte de um haitiano em Santa Catarina. E contra gente que prega esse tipo de coisa em páginas de jornais, confesso, não sou exatamente cristão. Ora respondido ora respondendo, quando o nível abaixa, não faz sentido ser diplomático e parto para a igual estupidez, seu idioma fluente. Aí o agressor, normalmente, corre para o papel de coitado agredido e recorre ao site para providências. Providências, que infelizmente, não são tomadas contra ele agressor, embora o Face tenha cancelado diversas páginas extremistas e algumas páginas de militância, uma Justiça cega que puniu agredidos e agressores.
A orwellização do mundo, praticada por Google e Facebook, colocam você na sua forma mais pura para quantas empresas se interessarem (a começar por elas mesmas), mas é preciso que se saiba que você é muito mais que um perfil na rede social, um número. Acho justo que o Facebook tenha o cuidado de saber quem eu sou. Não nego meu nome, minha opinião e minhas convicções. Talvez deva moderar meu trato com a ignorância alheia. De ser cristão e dar a outra face devo ser budista e ignorar o mal que se faz, pois sou superior. Espero que o Facebook, de posse de meus dados, saiba que eu sou eu, que eu existo no mundo fático. Por ora, estou desplugado do mundo. Numa sala 101? Não sei. Se temporariamente deixei de existir, fora dessa realidade paralela, nessa outra, de coisas tácteis continuo sendo eu mesmo. Que eu não tarde a voltar, mas que minha volta seja definitiva para não mais haver incômodos. 

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Fabio Assunção, um libelo (e umas porradas)

Não sou o tipo de pessoa que assiste a novelas. A última que acompanhei não lembro nome nem ano. Talvez tenha sido a Rei do Gado, que foi reprisada recentemente, e a novela Vamp, uma das melhores. O que sei dos folhetins hoje eu pesco por osmose já que toda revista fala sobre, jornais espalham spoilers e as pessoas invadem seu dia-a-dia com o assunto, o capítulo de ontem, quão safado é aquele vilão e a coitada que é aquela mocinha. Certa forma, as novelas não mudaram muito e o que mudou foi pra pior, sem querer bancar o moralista. Apenas me desinteressei. Não vale a pena.
No entanto, sei que hoje estreia uma nova novela das sete e existe uma expectativa em cima da volta do ator Fabio Assunção às tramas depois de sete anos ausente delas, um vencedor contra o vício de cocaína que quase arruinou sua carreira, sua volta por cima e clichês e mais clichês sobre o tema.
Coincidentemente o que tem entre as novelas que já acompanhei e ele é justamente ele. Nas duas, ele participou. Certo, os tempos eram outros. Fábio Assunção era, naquele tempo, o que é o Bruno Gagliasso ou o Cauã Raymond (não vou procurar o nome do rapaz) hoje, um menino bonito, olhos claros, a cara da zona sul carioca e que, além do estético, se destacava no artístico. Surgiu como um grande ator, promissor que logo se revelou ser, realmente, bom nas coisas da interpretação. Confesso que quando descobriram que ele era viciado em cocaína, eu, da minha parte, fiquei muito surpreso. Sempre o encarei como aquele amigo careta que fugia da roda de amigos fumantes e ficava vendo de longe a galera que fazia a cabeça nas festas. A gente se engana com certas aparências.
Lembro-me que quando se revelou seu vício, revistas fizeram campanhas abraçando o moço. A Veja o retratou na capa com a chamada “A Luta Pela Vida”. Claro que vencer um vício, seja ele qual for, é uma luta árdua, contínua e sem fim. Concordo com os que dizem que esse tipo de doença (o vício) é incurável. Não existe ex-alcoólatra ou ex-viciado em crack. Existe o viciado que, por mais um dia venceu o vício. Numa figura de linguagem fofa, pô-lo pra dormir e faz um silêncio íntimo para não acordá-lo.
Conheço pessoas viciadas nas mais diversas drogas e constato que as liberadas são tão ou mais prejudiciais quanto as ilícitas. E aí se entra naquele velho debate do “legaliza”, “descriminaliza”, algo tão extenso, maçante e polêmico que não vou erguer bandeiras aqui. O que me incomoda, mais do que bandeiras pró-drogas (todas irrestritamente) ou pró-vida (seja lá o que for isso) é ver que muitas das mesmas pessoas que se comoveram e torceram (e torcem) pela recuperação do ator global, bonito e famoso são aquelas que fazem um esgar para o bêbado caído na rua inconsciente ou as pessoas perdidas e anônimas numa cracolândia. E para tantos pregam a solução cabal: prende todo mundo e mata!
Incoerente? Bastante. O que, além da fama e dos olhos azuis que o colocam como um padrão de beleza pré-estabelecido, difere o Fabio Assunção deles todos? Por que para ele a luta pela vida deve ser valorizada, incentivada e aplaudida quando bem sucedida e para os outros nem uma chance, uma piedade deve ser considerada e lhes cabe apenas uma bala na cabeça? Imagino que tanto ele quanto eles procuraram as drogas e se perderam nelas. Não conheço casos de pessoas que invadam residências metendo uma arma na cabeça do possível “cliente” coagindo a se viciar. Claro que existem os que induzem menores aos vícios, tanto os traficantes de esquina como os publicitários que vendem cerveja usando de mulheres espetaculares para isso. Isso é inadmissível. Esses são inescapáveis de punição por divulgar um malefício e merecem o peso rígido da lei, tanto o traficante de esquina quanto o publicitário. Um não é pior que o outro. Da mesma forma, tanto o Fábio Assunção quanto o rapazote que caiu nas garras do crack merecem a chance e o apoio para se livrar dessas porcarias. E isso deve ser feito de forma voluntária. Sem a vontade própria não existe cura, existe a limpeza de um organismo que será poluído de novo. Não vai adiantar.
Quanto ao Fábio Assunção, que vem de uma vitoriosa participação no seriado Tapas e Beijos, torço para que, como na luta contra a droga, ele tenha sucesso nessa novela. Se ele já não é mais o galã dos tempos em que eu as acompanhava, restou a ele o talento que brotou naquela época. Para os outros tantos fabios, joões, josés e marias viciados, sem oportunidade na Globo, sem o talento interpretativo do outro, meu desejo é para que tenham a mesma obstinação e vontade de viver que ele tem (e, claro, que o dinheiro e boas clínicas ajudam) e vençam esse mal. Quantos grandes profissionais e artistas não temos nesses porões humanos esquecidos e odiados? E aos que colocam para os casos dois pesos e duas medidas, cuidem de suas vidas, tratem os seus vícios e, se não querem ajudar, por favor, não atrapalhem.  

sábado, 7 de novembro de 2015

Crônica de um Fim Anunciado ou Estendendo um Prazer



Estou lendo o livro Quem Foi que Inventou o Brasil de Franklin Martins, obra excelente que conta sobre as músicas de teor político na história do Brasil. Ou seja, a obra mistura dois temas que adoro: Música e História. A luta para achar esse livro, que embora novo estava difícil de ser encontrado nas grandes livrarias, mereceria uma crônica à parte, que não vira à luz. Vale contar apenas que, finalmente, o encontrei, comprei há pouco mais de um mês e estou lendo e já chegando ao cabo de suas 589 páginas. Faltam pouco mais de cem. E é um momento que odeio, o fim de um livro que é muito bom.
Parábola alguma explica melhor o que é a vida ou seus ciclos que um livro. Ele começa, tem um momento excitante, inesquecível, mas hora chega que ele acaba e deixa saudade. Se algo agradou, seja o autor, o tema, o estilo, vai-se atrás de outro para saborear mais daquilo que foi bom e que você queria que não acabasse, mas que, como tudo, tem um fim, o que é inevitável e infalível.
Mesmo os livros ruins, como as fases ruins da vida, também dão um prazer enorme quando acabam. Você pede a todos os deuses que nunca mais lhe caia algo tão pérfido nas mãos. Assim são os livros nos ensinando de forma didática esse breve tempo que chamamos de vida.
No caso desse livro específico, a consciência de que ele está chegando ao fim é algo que me chateia, mas, página após página, ele me ensina que é preciso lidar com essa chegada. A minha defesa, não tão eficiente, mas paliativa, é deixa-lo de lado por um dia ou dois. Aí, mais anestesiado com a sensação do fim (ou, pelo menos enganado por mim mesmo que ela não virá tão cedo, pois eu a estendi), sigo a leitura. E as sensações voltam e as providências são repetidas. Assim será até o dia em que a última página dará um tapa na minha cara gritando como a composição do metrô na Barra Funda “Desembarque obrigatório!”.
Estou nesse trem há, pelo menos, uns quatro anos com outro livro, um dos que mais me deixou feliz ao vê-lo meu: o 200 Crônicas Escolhidas, de Rubem Braga. Sobre ele até escrevi a crônica Rubem Braga em 2012, quase três anos (foi em fins de novembro que a escrevi). E passado esse tempo, o livro ainda paira em minha estante. Minhas “conversas” com Rubem Braga seguem como aquelas: breves. Este livro entra na categoria que coloco o sobre o qual falo aqui. Não dá vontade de acabar. Não quero acabar.
 Mas ele acabará, é isso que preciso aceitar. Ele, o do Braga, outros tantos, todos enfim. O que sobrará disso? Saudades e reminiscências. Voltarei a folheá-los como quem folheia álbuns de fotografia lembrando sempre de uma foto e preferindo aquela às outras, que não são ruins, apenas não são melhores que a outra.
Talvez o fim do livro seja um momento para se preparar para um próximo, como os ciclos da vida, em que você sai de um maduro e preparado para outro ou (segundo os kardecistas a quem respeito muito) para uma próxima vida com todos os ensinamentos desta. Retomo o que escrevi no começo dessa crônica, o fim de um livro inspira a buscar mais daquilo que o atraiu naquele. No caso desse Quem Foi..., o presente livro é o primeiro volume de três. Há outros dois a serem vividos ainda e disso tenho plena consciência e desejo de viver.
Mas como dói abandonar o presente estágio, por mais que seja necessário. Como dói!

Francisco Libânio,
07/11/15, 11:14 AM

terça-feira, 3 de novembro de 2015

A nova loira do Calypso é linda (e chega lacrando!)

(Esse é um post militante e defensor de minorias além de conter alta carga de futilidade com um toque de Nelson Rubens e Sonia Abraão. Se qualquer uma dessas características desagrada o casto e conservador leitor, recomendo que encerre sua leitura nessa frase. Se você continuou a ler essa outra e arrisca se aventurar a ler o resto não me responsabilize nem venha com mimimi. Obrigado.)

Essa semana foi anunciada a cantora que substituirá a vocalista Joelma na Banda Calypso a acompanhar o guitarrista Chimbinha. A sucessora se chama Tábatha Mendes, tem 28 anos, é potiguar e já tinha uma carreira anterior antes dessa nova fase num dos grupos mais adorados pela massa e que é referência de música regional, mas quem nos últimos meses tem mais aparecido por conta de brigas conjugais que ultrapassaram as paredes do lar e desembocaram nos palcos proporcionando cenas tristes e dignas de se pedir o dinheiro de volta. Espera-se que, com a separação definitiva, casa e palco, cada um dos ex-cônjuges siga sua vida pessoal e carreira. Chimbinha fez a parte dele.
De pronto a moça foi comparada a uma travesti (nada errado aqui. É um substantivo feminino mesmo. A gramática é fluida e é menos importante quando envolve respeito a uma classe). Certamente por fãs da antecessora, mulher assumidamente evangélica (que, inclusive, disse que seguiria carreira gospel. Que tenha sucesso), e que declarou ser contra casamentos homossexuais citando a Bíblia. O que pareceu ser uma ofensa foi mote para uma resposta arrasa-quarteirão: “Não vejo problema algum em parecer uma travesti. São seres humanos como eu e fico extremamente honrada se, de alguma forma, eu puder representa-las. Respeitar as pessoas é fundamental”. Como diriam as travestis, nessa história Tábatha “lacrou”.
Música é um negócio, para alguns, que mexe como mexe o futebol e carrega uma passionalidade excessiva. Goste-se ou não, a Banda Calypso tem um público fiel que, durante esse ínterim de confusão e lavação de roupa suja, acabou tomando partido de um ou de outra. Muita gente viu Chimbinha como um canalha que traiu a esposa maculando o sacramento do matrimônio. Também teve quem visse Joelma como uma mulher descompensada que levou para os palcos misturando campos pessoal e profissional. Nenhum dos dois times está errado, mas que Joelma não soube lidar de forma madura e profissional com o assunto, isso é claro.
Nesse caldo todo há o elemento musical. Joelma, goste-se ou não, era a “cara” da Banda Calypso. Há mais de vinte anos cantando e saracoteando, ela era a “mulher do Calypso”. E isso impregna seja qual for o estilo. Não se imagina o U2 sem o Bono ou as Supremes sem a Diana Ross. Vai demorar para que Thábata “pegue” e corre o risco de não acontecer, mas o show precisa continuar e a menina precisará mostrar serviço. E, por isso, é claro, que fãs mais xiitas da Banda Caypso vão ser cruéis com a nova loira. Muitos, inclusive, retomando o nome de travesti que deram a ela.
E aqui cabe uma reflexão sobre o tema: a insistente associação das travestis ao pejorativo. É comum entre homens, ao encontrar uma mulher que, seja muito feia seja fora dos padrões estabelecidos (ah, os padrões) ou seja o que for, mas não agrade, chama-la de “travesti” ou “traveco”. Recentemente a apresentadora Xuxa, num programa do Rodrigo Faro disse que ele estava “feio como um travesti” o que rendeu críticas a ela, de grupos de defesa dos direitos GLBT a pessoas comuns indignadas com a agressão passando pelas próprias travestis. Não pegou bem.
Conheço poucas travestis. Travestis famosas também são raras. A mais emblemática é a Roberta Close, que mais tarde fez a cirurgia de redesignação sexual (porque ninguém “muda de sexo”, apenas se adapta, mas isso é outra história). Recentemente a atriz Laverne Cox, que participa da série Orange is New Black e ganhou holofotes pela interpretação, também é transexual. A semelhança entre elas: Ambas são muito bonitas. Roberta, inclusive, com “detalhe” e tudo, foi um símbolo sexual nos anos 80 e uma das edições mais vendidas da revista Playboy.
A verdade é que beleza é um dos conceitos mais subjetivos que uma pessoa pode construir. Nem sempre o belo universal é o belo pessoal como muitas vezes, o feio para muitos é uma beleza sem igual para alguém. E aí, enfrenta-se o problema. Como mostrar essa beleza para a Sociedade (ah, a Sociedade) e escapar ileso da crucificação? Imagino que a solução para isso é, simplesmente, ignorar a sentença de morte e viver a própria vida. Há casos felizes de namoros e casamentos – sim, casamentos! – entre mulheres e homens – sim, homens! – transexuais e pessoas do sexo oposto. Eles estão aí. Existem e contemplam pessoas felizes. E não tem desaprovação moral, repúdio religioso, implicância pura e simples que destrua isso. Para essas pessoas pouco importa a opinião da Xuxa associando travesti a feiura e nem Joelma falando  que isso é errado. Para essas pessoas, a comparação de Thábata Mendes a uma travesti é algo meritório, pois se uma travesti foi comparada a ela, pode se orgulhar. Como a nova loira do Calypso, ela é muito, mas muito bonita. 

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Antes das redes sociais como as pessoas mostravam seu amargor?

Leio num site (o bom Catraca Livre) a afável notícia de uma menina de quatro anos, filha de um tatuador, que fez uma tatuagem em seu pai. Desenhou um moranguinho com a peculiar arte que a idade empresta. A reação à notícia nas redes sociais é imediata. Entre um e outro elogio ao terno momento de fofura uma enxurrada de críticas. Alguns indignados com permitir que a filha use agulhas. Outros, que devem ter visto a manchete e a foto e tirado a associação “lógica”, que o pai é um criminoso por ter feito tatuagem numa menina de quatro anos. E uns tantos criticando o desenho em si. Várias pessoas disseram que a parte verde do desenho parece uma folha de maconha. Enfim, o festival de absurdos desanima.
Não sei se é por ter uma filha de idade próxima à dessa menina ou o fato de eu sempre gostar de crianças e sempre me permitir brincar com elas ou, ainda, eu ter, talvez, uma interpretação de texto (ou mesmo um sentimentalismo) melhor que esse povo, mas a notícia me tocou. O que vi ali foi uma criança marcando em seu pai um desenho eterno, um gesto de amor que qualquer pai carregaria com orgulho. O pai, como tatuador, deve manjar da arte e fazer desenhos muito bons, mas esse moranguinho rústico é, de longe, o mais bonito de todos para ele, pois foi dedicado.
O que me surpreende, voltando à notícia, é ver como as pessoas andam amargas ou maldosas. Como está difícil para essa turma ver doçura num gesto pequeno e está fácil ver maldade. Como uma criança de quatro anos vai desenhar UMA FOLHA DE MACONHA, algo que tantos demonizam, mas para uma criança – se reconhecer uma – é apenas uma plantinha?
O que essas pessoas faziam antes das redes sociais? Quando o máximo que se podia ser feito para fluir maldade e rancor era falar mal de um terceiro a uma vizinha ou a um colega do trabalho, como essas pessoas lidavam com a impressão de serem estúpidas ou somente amargas? Claro que num desses “desabafos”, ela sempre encontrava alguém que, por identificação ou igual falta de doçura, endossava essa coisa horrível, essa falta de deus no coração que era qualquer coisa que ela não concordasse ou achasse imoral (essas pessoas acham coisas demais imorais).
Se uma criança fizesse uma tatuagem no pai, primeiro, iriam dizer que o pai é uma má influência por ter tatuagem (afinal tatuagem é coisa ou de marinheiro ou de bandido). Depois iriam dizer comentar que, como todo tatuado, o pai usa drogas e, por isso, a filha sabia o que era uma folha de maconha (afinal toda generalização é verdadeira menos essa) além de outros absurdos. A diferença: O máximo que atingiria seria duas ou três pessoas. Cinco numa hipérbole.
As redes sociais conseguiram unir essas pessoas. Puderam trocar experiências em amargura e falta de tato. Puderam destilar um pouco do que seus corações frios guardam, mas, sobretudo, mostraram o quão triste é ser assim. Ver maldade numa mera tatuagem, ver abuso num afeto. Nem falo sobre ofender negros e seus ícones de beleza. Racismo sempre existiu (infelizmente) e está abaixo do amargor que é o tema aqui. É completa estupidez e boçalidade. Dignas de cadeia. Somente.

Que isso não chegue a essa simpática família. E se chegar que inspire pai e filha (ainda que a idade a alheie de tamanha insensatez) a fazerem outro morango, ou, em homenagem a tamanho amargor, um limão. Feito por essa pequena artista seria mais lindo que tudo o que foi escrito sobre.

domingo, 1 de novembro de 2015

Quem é o escritor sem palavras? (dedicado a um tocador de cítara)

O escritor sem palavras é aquele que acha que escreve alguma coisa e não escreve tanto assim. É o poeta que rimou dois versos e se definiu poeta. Esqueceu-se, ele, que hoje a poesia é muito mais que a rima (até porque, como se disse, isso foi abolido em 1922 pelos quase centenários modernistas).
Enfim, o escritor sem palavras é o escritor que não sabe escrever ou que acha que sabe. E, convencido por si só e somente ele disso, resolve usar dessas ferramentas que a modernidade deu para que se divida o que ele escreve, o blogue e as redes sociais.
Há uma fábula esopiana que conta de um tocador medíocre de cítara tocava e cantava em seu quarto cujas paredes faziam sua voz e sua música serem melodiosas. Quando se meteu a cantar num teatro, foi tão mal sucedido que foi expulso a pedradas.
Para azar desse citarista, naquela época não havia o You Tube, as redes sociais, nada. Poderia tocar no quarto, gravar e subir o vídeo. Seria poupado das pedradas, mas ganharia vários unlikes. Dói menos
Apoiando-me nessa malfadada experiência, do meu quarto onde escrevo uso o blogue para lançar nas redes sociais meus escritos. Os escritos do escritor sem palavras que encherão um espaço pequeno e não contam com muita fé. Se houver dez leitores assíduos será o suficiente.
São dois os obstáculos do escritor sem palavras. O primeiro é apresentar seus textos tendo entre seus amigos escritoras (sim, quatro mulheres, que escrevem e um amigo, logo o feminino prevalece. Sorry, Gramática, essa é a MINHA regra) que debulham o assunto. Poderiam ser boas juradas (um negócio meio The Voice. Olha eu e minha cítara de novo) e orientadoras. O segundo sou eu mesmo, meu leitor mais crítico, ranheta e exigente. Já ando pela vigésima quinta linha (segundo meu Word) de texto e estou com ânsia de desistir do blogue. Passou. Não vou desistir.
Vou é encerrar por aqui o texto. É uma breve apresentação desse projeto que serve para alinhavar o que pretende ser esse espaço, um lugar de abordagens um tanto confessionais ou fantasiosas; canto para crônicas e impressões escritas ou somente ideias soltas de uma pessoa que adora escrever e resolveu sair do quarto para dividir isso com os outros. Nada demais. A mesma audácia do tocador de cítara, mas com o cuidado de não fazer isso num auditório.

Sejam leves nas pedradas virtuais.