Não sou o tipo de pessoa que assiste a novelas. A última que
acompanhei não lembro nome nem ano. Talvez tenha sido a Rei do Gado, que foi
reprisada recentemente, e a novela Vamp, uma das melhores. O que sei dos
folhetins hoje eu pesco por osmose já que toda revista fala sobre, jornais
espalham spoilers e as pessoas invadem seu dia-a-dia com o assunto, o capítulo
de ontem, quão safado é aquele vilão e a coitada que é aquela mocinha. Certa
forma, as novelas não mudaram muito e o que mudou foi pra pior, sem querer
bancar o moralista. Apenas me desinteressei. Não vale a pena.
No entanto, sei que hoje estreia uma nova novela das sete e
existe uma expectativa em cima da volta do ator Fabio Assunção às tramas depois
de sete anos ausente delas, um vencedor contra o vício de cocaína que quase
arruinou sua carreira, sua volta por cima e clichês e mais clichês sobre o
tema.
Coincidentemente o que tem entre as novelas que já
acompanhei e ele é justamente ele. Nas duas, ele participou. Certo, os tempos
eram outros. Fábio Assunção era, naquele tempo, o que é o Bruno Gagliasso ou o
Cauã Raymond (não vou procurar o nome do rapaz) hoje, um menino bonito, olhos
claros, a cara da zona sul carioca e que, além do estético, se destacava no
artístico. Surgiu como um grande ator, promissor que logo se revelou ser,
realmente, bom nas coisas da interpretação. Confesso que quando descobriram que
ele era viciado em cocaína, eu, da minha parte, fiquei muito surpreso. Sempre o
encarei como aquele amigo careta que fugia da roda de amigos fumantes e ficava
vendo de longe a galera que fazia a cabeça nas festas. A gente se engana com
certas aparências.
Lembro-me que quando se revelou seu vício, revistas fizeram
campanhas abraçando o moço. A Veja o retratou na capa com a chamada “A Luta
Pela Vida”. Claro que vencer um vício, seja ele qual for, é uma luta árdua,
contínua e sem fim. Concordo com os que dizem que esse tipo de doença (o vício)
é incurável. Não existe ex-alcoólatra ou ex-viciado em crack. Existe o viciado
que, por mais um dia venceu o vício. Numa figura de linguagem fofa, pô-lo pra
dormir e faz um silêncio íntimo para não acordá-lo.
Conheço pessoas viciadas nas mais diversas drogas e constato
que as liberadas são tão ou mais prejudiciais quanto as ilícitas. E aí se entra
naquele velho debate do “legaliza”, “descriminaliza”, algo tão extenso, maçante
e polêmico que não vou erguer bandeiras aqui. O que me incomoda, mais do que
bandeiras pró-drogas (todas irrestritamente) ou pró-vida (seja lá o que for
isso) é ver que muitas das mesmas pessoas que se comoveram e torceram (e
torcem) pela recuperação do ator global, bonito e famoso são aquelas que fazem
um esgar para o bêbado caído na rua inconsciente ou as pessoas perdidas e
anônimas numa cracolândia. E para tantos pregam a solução cabal: prende todo
mundo e mata!
Incoerente? Bastante. O que, além da fama e dos olhos azuis
que o colocam como um padrão de beleza pré-estabelecido, difere o Fabio
Assunção deles todos? Por que para ele a luta pela vida deve ser valorizada,
incentivada e aplaudida quando bem sucedida e para os outros nem uma chance,
uma piedade deve ser considerada e lhes cabe apenas uma bala na cabeça? Imagino
que tanto ele quanto eles procuraram as drogas e se perderam nelas. Não conheço
casos de pessoas que invadam residências metendo uma arma na cabeça do possível
“cliente” coagindo a se viciar. Claro que existem os que induzem menores aos
vícios, tanto os traficantes de esquina como os publicitários que vendem
cerveja usando de mulheres espetaculares para isso. Isso é inadmissível. Esses
são inescapáveis de punição por divulgar um malefício e merecem o peso rígido
da lei, tanto o traficante de esquina quanto o publicitário. Um não é pior que
o outro. Da mesma forma, tanto o Fábio Assunção quanto o rapazote que caiu nas
garras do crack merecem a chance e o apoio para se livrar dessas porcarias. E
isso deve ser feito de forma voluntária. Sem a vontade própria não existe cura,
existe a limpeza de um organismo que será poluído de novo. Não vai adiantar.
Quanto ao Fábio Assunção, que vem de uma vitoriosa
participação no seriado Tapas e Beijos, torço para que, como na luta contra a
droga, ele tenha sucesso nessa novela. Se ele já não é mais o galã dos tempos
em que eu as acompanhava, restou a ele o talento que brotou naquela época. Para
os outros tantos fabios, joões, josés e marias viciados, sem oportunidade na
Globo, sem o talento interpretativo do outro, meu desejo é para que tenham a
mesma obstinação e vontade de viver que ele tem (e, claro, que o dinheiro e
boas clínicas ajudam) e vençam esse mal. Quantos grandes profissionais e
artistas não temos nesses porões humanos esquecidos e odiados? E aos que
colocam para os casos dois pesos e duas medidas, cuidem de suas vidas, tratem
os seus vícios e, se não querem ajudar, por favor, não atrapalhem.
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